O que está adormecido irá acordar
(Clicar)
Mais brilhante que o Sol,
este lago a ferver como um grande caldeirão,
e apesar de nenhuma coisa viva suportar
esta caldeira ardente, num calor de fusão,
Peres do'Vale vislumbrava aqui criaturas
demasiado escuras e temíveis para contemplar.
Contorcendo-se abaixo da superfície a ferver,
em chamas escarlates, âmbar, douradas,
estavam seres com asas e presas e garras,
como saídas do abismo a rastejar.
Mas na margem estava um Cavaleiro
adornado com um manto de branco virginal,
com uma cruz vermelha gravada no peito
e uma luz sagrada à sua volta a brilhar.
Para Peres do'Vale este Cavaleiro se voltou,
Levantou o braço em direcção ao lago,
e num tom severo, de comando,
ordenou a Peres do'Vale que aí os tesouros lançasse.
Peres do'Vale ficou quieto como uma rocha,
o seu coração tornou-se frio, os seus dedos gelaram,
sentindo que não suportaria deitar fora
os tesouros preciosos que tinha nas mãos.
E então o Cavaleiro falou uma vez mais,
e a sua voz era uma seta que fundo o atingia :
"Nós somos Irmãos, Peres do'Vale,
e os teus Irmãos não te vão enganar.
Tudo o que for perdido será recuperado.
Tudo o que está adormecido irá acordar."
E Peres do'Vale, recuperada a sua fé,
inclinou-se e atirou os tesouros.
A cruz de ouro brilhante e puro,
amarelo como o Sol da manhã;
o castiçal de sete braços
de prata batida, reluzente;
por fim o crescente de chumbo martelado,
de superfície cinzelada, de tom sombrio.
De repente surgiu uma canção
de muitas vozes em uníssono,
transportadas pela brisa, doces e puras.
Elas encheram o céu como uma aurora matinal.
Agora o lago já não era de fogo
mas sim de águas tranquilas, azuis e transparentes,
e delas saiu uma figura dourada
com olhos de prata e cabelos de chumbo.
Peres do'Vale caiu de joelhos
e chorou de pura alegria.
Levantou a cabeça e três vezes clamou
Salvé! Salvé! Salvé!
"Livro do Graal"
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